Autor: Creso Tatiano Lima

A linguagem é uma atividade humana cujas categorias observáveis se modificam com o tempo e apresentam um funcionamento interdependente do tipo de contexto social em que ocorrem. A linguagem não existe num vácuo, mas imersa numa rede de valores discursivos. Todo o universo linguístico constrói-se, existe e funciona num universo social, coletivo, e não pode ser abstraído dessa condição[1].
Uberização, globalismo, pós-verdade, lacração, cancelamento, ideologia de gênero, marxismo cultural, comunismo, fascismo são algumas das categorias cunhadas ou ressignificadas no mundo contemporâneo, marcado por uma disputa política e ideológica fortemente polarizada.
Essas expressões, largamente proferidas nos meios de interação dos atores em disputa, são categorias linguísticas estrategicamente utilizadas como simplificação da realidade e reunião de atributos.
Razão pela qual Wittgenstein assinala que “denominar algo é semelhante a colocar uma etiqueta numa coisa”. Para ele a linguagem é uma caixa de ferramentas de que nos servimos para selecionarmos os recursos mais adequados quando precisamos interpretar ou comunicar o nosso pensamento[2].
Assim, em determinados contextos, comunismo não necessariamente expressa um modelo econômico baseado na igualdade material e em uma sociedade sem classes, mas é ressignificado para reunir atributos que caracterizam os opositores do conservadorismo, por exemplo. Se antes o comunismo expressava uma ameaça à propriedade privada, hoje ele pode expressar uma ameaça à cultura ocidental, evoluindo para a expressão “marxismo cultural”.
Do mesmo modo, fascismo pode não ser mais uma expressão que caracteriza uma política ultranacionalista, centralizadora e autoritária, e sim um conjunto de atributos típicos de governantes conservadores e populistas.
Além da ressignificação, novas categorias linguísticas são criadas e desenvolvidas com o mesmo propósito de generalização e abstração, a exemplo do termo “uberização” que traduz uma nova forma de organização do trabalho envolta em atributos como flexibilização, desburocratização, autonomia e precarização.

Referências

  1. GARCEZ, Lucília Helena do Carmo. A escrita e o outro: os modos de participação na construção do texto. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 47-48
  2. NADER. Paulo. Filosofia do Direito. 27. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 120.