ACORDÃO 70-SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 16.121 - EX (2016/0254907-5)
Trata-se de contestação ao Superior Tribunal de Justiça para homologação de sentença estrangeira referente exercício do poder paternal cumulada com alimentos e regulamentação de visitas. Nos autos verifica-se que a filha do requerido nasceu no Estado do Rio de Janeiro, Brasil, e, logo em seguida depois de seu nascimento, a genitora migrou com ela para Portugal. Como fato importante para análise, tem se que os pais da descendente são brasileiros.
Diante do exposto, a genitora procurou a justiça de Portugal pleiteando alimentos e a regulação das visitas da filha. A justiça portuguesa entendeu que havia competência para julgar e processar a lide e então deu andamento à ação. Após tentativas infrutíferas de citar o genitor, foi encaminhado a Defensoria Pública da união uma notificação para indicar um curador especial.
A Defensoria Pública da união contestou a competência da Justiça de Portugal justificando que caberia à Justiça Brasileira processar e julgar a ação. O Ministério Público Federal, após ser requisitado pela Suprema Corte brasileira, opinou pelo deferimento do pedido de homologação da sentença estrangeira alegando que se tratava de competência concorrente.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal, buscando o entendimento dos legisladores da matéria, analisou o art. 15 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, o artigo 963 do Código de Processo Civil de 2015 e a jurisprudência da corte. Em síntese, extraiu do diploma normativo que a matéria não é de competência concorrente e não homologou a sentença estrangeira.
Analisando o caso, percebe-se que trata de uma questão de Soberania do Direito brasileiro em detrimento a eficiência e efetividade da Justiça. O reprocessamento da lide na Justiça brasileira forneceria praticamente o mesmo resultado a menor de idade desamparada da pensão alimentícia e das visitas do genitor, ao preço da morosidade processual e o desgaste na relação intrafamiliar.
A realidade e a aplicação do diploma normativo deveriam compor uma relação de dependência, produzindo um Direito de fato material e humanizado e não apenas formal e técnico. Convergente essa tese, o autor, Dias [s.d.] ao tratar do tema do direito justo, nos ensina:
A ciência precisa romper com o fechamento da razão lógica e recuperar a razão sensível para que possa compreender a socialidade nascente que se expressa em todas as formas de solidariedades coletivas, nas relações afetuais, proxêmicas e empáticas, no sentimento de pertença a distintos grupos – "neotribalismo" – na identificação com um, "nós" que supera todos os individualismos, na ação conjunta que busca a transformação do tempo presente e leva à constituição da comunidade de destino. O direito não pode mais ser pensado apenas enquanto técnica de regulação coercitiva da vida social, pois esta não se constitui somente de ordem, organização e razão, mas também de afeto, sensibilidade, desordem, rupturas, caos. Não há como expurgar a sombra da luz; todos estes elementos convivem numa relação dialética de complementaridade. E o Direito, cujo sentido de ser é ser para a sociedade, deve em sua constituição considerar todos estes elementos. (DIAS, [S.d.]).
Superada esta questão, partimos para o embate se de fato trata-se de uma questão internacional de competência concorrente ou apenas de competência da Justiça brasileira. O código de Processo Civil prevê:
Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.
Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.
A interpretação do dispositivo referido no seu inciso II aponta para que apesar da obrigação iniciar no Brasil apenas se efetivaria em Portugal e, por tanto, configurando a questão como Direito concorrente. Esse núcleo normativo limita a condição da obrigação para sua satisfação a ocorrência e a efetivação em território nacional, o que não ocorre, de fato, no presente caso.